terça-feira, 20 de abril de 2010

OUR LOVE... NO ESPAÇO CULTURAL PYNDORAMA

Em curta temporada, espetáculo reflete sobre espaço urbano e relações humanas. 


Livremente inspirado na obra homônima de Martin Boyce, é uma reflexão poética, uma provocação sobre o espaço urbano e a viabilização das realizações afetivas, na perspectiva da virtualização das mesmas e consequente reafirmação das solidões. Parte de células coreográficas, movimentação aberta e ações gestuais para compor um mosaico de encontros e desencontros.

O interesse pela obra de Martin Boyce deu-se, num primeiro momento, pela aparente contradição entre os títulos de suas obras e as sensações por elas inspiradas: enquanto os títulos muitas vezes evocam sentimentos como o amor e atitudes como o romantismo, os elementos e objetos de caráter urbano/industrial e sua organização remetem a um ambiente planejado, porém gélido. Assim é o caso da instalação “Our Love is Like the Flowers, the Rain, the Sea and the Hours”, de 2002, uma espécie de “parque noturno”, nas palavras do próprio artista, em que o público pode circular e relacionar-se com o espaço.

Particularmente, sua obra chamou a atenção do grupo por tratar de uma praça, um espaço planejado originalmente para o convívio e a contemplação da natureza, no entanto, os elementos que compõem a instalação vão contra esta proposição. Na medida em que são artificiais e impessoais, esses elementos se referem ao mundo natural negando, no entanto, o contato real com ele. Funcionam quase como um monumento a um saudoso passado, a algo que se foi.

O arranjo destes elementos específicos funciona como uma metáfora das relações humanas, em que os elementos culturais e tecnocráticos sobrepujam a natureza, em que o medo e a insegurança mobilizam as ações para a garantia do sucesso; a aniquilação dos riscos traz consigo a morte das surpresas, do inesperado e inusitado no dia-a-dia.

A partir dessas reflexões, a oba coreográfica foca as relações pessoais estabelecidas neste espaço público, revelando a distância que temos uns dos outros e em como isso é exposto sem que nos demos conta. Assim como sugere Boyce, buscando a criação de utopias que transcendam os modelos de relações desgastados. 

 
No mais, a presença do vazio existencial perante um mundo injusto permanece, e o que é urgente não é negar-lhe espaço, e sim dar-lhe vazão. Não se trata de um neo-niilismo, mas de assumir uma constatação que já não é nem nova: a tecnocracia, com fim em si mesma, é nociva e não atende nem de longe o anseio por uma sociedade de pessoas livres e autônomas, que direcionam suas escolhas para sua auto-realização, e não meramente para a minimização dos fracassos e maximização dos sucessos.





Sábados, 01, 08 e 15 de maio à meia-noite.
Espaço Cultural Pyndorama
Rua Turiassú, 481 - Perdizes (Próximo ao metrô Barra Funda)
Reservas e informações: 11 3871-0373
Ingressos: R$ 10,00 inteira e R$ 5,00 meia

domingo, 28 de março de 2010

O amor bate na aorta (Carlos Drummond de Andrade)

Cantiga de amor sem eira
nem beira,
vira o mundo de cabeça
para baixo,
suspende a saia das mulheres,
tira os óculos dos homens,
o amor, seja como for,
é o amor.

Meu bem, não chores,
hoje tem filme de Carlito.

O amor bate na porta
o amor bate na aorta,
fui abrir e me constipei.
Cardíaco e melancólico,
o amor ronca na horta
entre pés de laranjeira
entre uvas meio verdes
e desejos já maduros.

Entre uvas meio verdes,
meu amor, não te atormentes.
Certos ácidos adoçam
a boca murcha dos velhos
e quando os dentes não mordem
e quando os braços não prendem
o amor faz uma cócega
o amor desenha uma curva
propõe uma geometria.

Amor é bicho instruído.

Olha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue
que corre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem,
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã.

Daqui estou vendo o amor
irritado, desapontado,
mas também vejo outras coisas:
vejo beijos que se beijam
ouço mãos que se conversam
e que viajam sem mapa.
Vejo muitas outras coisas
que não ouso compreender...




domingo, 19 de julho de 2009

Our Love... no Teatro X

Registro feito pela Luba em 30 de julho de 2009.


Dia 22 de agosto tem Our Love no Teatro Mu
nicipal de Barueri Às 20h00

http://www.youtube.com/watch?v=OkE9IcYd80g

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Maiakovski, e os dias de hoje?

Maiakovski, poeta russo "suicidado" após a revolução de Lenin… escreveu, ainda no início do século XX :
Na primeira noite, eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite. já não se escondem, pisam nas flores, matam nosso cão.
E não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles, entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada.

Depois de Maiakovski…
Primeiro levaram os negros. Mas não me importei com isso.
Eu não era negro.
Em seguida levaram alguns operários. Mas não me importei com isso.
Eu também não era operário.
Depois prenderam os miseráveis. Mas não me importei com isso.
Porque eu não sou miserável.
Depois agarrarm uns desempregados. Mas como tenho meu emprego,
também não me importei.
Agora estão me levando. Mas já é tarde. Como eu não me importei com ninguém,
Ninguém se importa comigo.
Bertold Brecht (1898-1956)

Transcrito de: http://www.slideshare.net/Agostinho/maiakovski-teoria-do-caos-presentation

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

SOBRE O COLETIVO DE ARTISTAS INTERMITENTE ABISMO DE SONHOS

Em atividade desde 2005, o coletivo nasceu da parceria entre artistas de dança, teatro e artes plásticas, que têm como principal motivação a produção artística em processo colaborativo de criação, intercambiando informações de diversas áreas numa obra artística desterritorializada e, contudo, essencialmente engajada com as urgências da contemporaneidade.

Recluso c.3.3, solo em que Edson Calheiros estreou como intérprete-criador sob a direção de Rui Ricardo Diaz, inspirou-se nos escritos de Oscar Wilde em De Profundis, para compor uma metáfora da existência humana em relação ao sofrimento, questionando até que ponto somos prisioneiros ou os próprios algozes de nossas vidas. Trechos da obra A Paixão segundo G. H., de Clarice Lispector também serviram de inspiração para a criação deste solo.

Desculpe o Transtorno, duo de Calheiros em parceria com Robson Ferraz estreou em 2006 com direção de Nana Pequini, cenografia de Gustavo Ayala e trilha sonora de Allen Ferraudo. Foi um segundo momento na investigação dança X teatro: os textos foram suprimidos como opção dramatúrgica, enquanto nos dedicamos a explorar mais a transição entre movimentos dançados e gestuais. Originalmente um solo, Desculpe o Transtorno buscava estabelecer relações entre os transtornos psicossomáticos e o caos urbano ao qual as pessoas estão sujeitas. Neste sentido, punha-se como crítica a uma mecanização do cotidiano, e uma crescente padronização que oprimia, em maior ou menor grau, a auto-realização humana.

Memorial do quarto escuro, terceiro trabalho do coletivo e o primeiro realizado com apoio financeiro da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, parte de processos presentes nos trabalhos anteriores para compor uma espécie de inventário íntimo, em que debruçando-se sobre memórias, buscamos levar o público a uma experiência de contato direto com sua própria arqueologia pessoal.
É, sem sombra de dúvida, o momento em que se definem melhor até então as motivações e modos próprios do coletivo propor arte, o que se reflete numa transição mais orgânica de dança, movimentos gestuais e voz na cena.

A investigação colaborativa atinge um novo patamar com Our love is like the flowers, the rain, the sea and the hours, quarto trabalho estreado meses depois do Memorial e que envolvia três intérpretes-criadoras – Natália Fernandes, Natália Mendonça e Poliana Lima -, além de mim. As proposições para a cena ganharam uma multiplicidade de soluções a partir dos quatro performers, o que nos levou a um trabalho cênico de grande abertura de significações e desdobramentos.
Inspirado na obra homônima de Martin Boyce, artista plástico dinamarquês, Our love... é uma reflexão poética não conclusiva, uma provocação sobre o espaço urbano e a viabilização das relações afetivas, e parte de células coreográficas, movimentações abertas e ações gestuais/teatrais para compor um mosaico de encontros e desencontros num espaço-tempo não definido mas que não é, por outro lado, alheio.

O coletivo trabalha atualmente na circulação de seus espetáculos e no processo de criação de uma nova obra que investiga a virtualização da realidade e as noções de sonho, tanto como faculdade onírica como possibilidade de sublimação da realidade. Pretendemos, mais uma vez, explorar o ponto em que as tradições e preceitos sociais, culturais e políticos encontram o desejo pulsante por uma vida plena, e os embates e vislumbres que nascem deste encontro.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Memorial do quarto escuro

O quarto é o sítio da intimidade onde se encarnam memórias, angústias, desejos e esperanças. É também neste espaço que a tensão indivíduoXsociedade pode ganhar alívio, onde cada um está à mercê de sua consciência, e qualquer tentativa de aparência é inútil. Segredos, silêncios, mortes e nascimentos ocorrem no espaço-tempo de um pensamento-ação. Memorial do quarto escuro são fragmentos íntimos na busca de ser inteiro.


Foto: Paola Marino

http://www.youtube.com/watch?v=FZ01EMIaTNQ